A Expansão Produtiva e Urbana do
Município de Paulínia
Geógrafa
constata que o mapa de preços de mercado não é compatível ao de valores venais
Essa
rápida urbanização não veio acompanhada de políticas públicas efetivas de
planejamento e gestão equânimes do ponto de vista espacial, dando origem a uma
série de problemas urbanos como a ocupação desigual do território, decorrente
de processos especulativos imobiliários e da crescente diferenciação do valor
de troca e de uso da terra urbana. Tais constatações levaram a geógrafa
Fernanda Otero de Farias a realizar pesquisa centrada na cidade de Paulínia
procurando compreender, sobretudo, a dinâmica de valorização diferencial da sua
terra urbana nos últimos dez anos e as consequências para a realidade local.
Para
tanto, a pesquisadora entendeu fundamental: determinar a diferença entre o
valor venal das propriedades, que consta na Planta Genérica de Valores (PGV) do
município, e seu real valor de mercado; analisar as ações dos principais
agentes envolvidos na produção do espaço urbano, procurando entender a
participação de cada um deles na lógica de valorização da terra na cidade;
construir uma base de dados georreferenciados contemplando mapas temáticos
relacionados a importantes aspectos geográficos da configuração territorial
paulinense, como os dados de uso e ocupação da terra intraurbana, o zoneamento
municipal, o histórico de aprovação dos loteamentos, a localização dos
empreendimentos residenciais fechados, renda e densidade populacional
encontrada nos diferentes setores da cidade, além do mapeamento específico dos
preços praticados no mercado imobiliário local para os anos de 2002 a 2012.
Além disso, procurou identificar as principais áreas de tendência de crescente
valorização dentro do território estudado.
A
pesquisa, orientada pelo geógrafo e professor Lindon Fonseca Matias, que
coordena o Grupo de Estudos de Geotecnologias Aplicadas à Gestão do Território
(Geoget), do Departamento de Geografia do Instituto de Geociências (IG) da
Unicamp, foi particularmente motivada pela ausência, em relação a Paulínia, de
processo analítico envolvendo o tema, pela importância da cidade no contexto
regional, estadual e até mesmo nacional, por abrigar um dos maiores polos
petroquímicos da América Latina e, também, pela singularidade das
transformações nas formas de uso e ocupação da terra urbana. A pesquisadora
também recebeu orientação da professora Teresa Barata Salgueiro, especialista
em questões urbanas, durante estágio de três meses na Universidade de Lisboa,
financiado pela Fapesp.
Metodologia
A
metodologia empregada consistiu de uma revisão bibliográfica e aprofundamento
teórico do tema, envolveu pesquisas de campo, levantamento de dados com
entrevistas e aplicação de tecnologias de geoprocessamento para produção
cartográfica voltada à espacialização de diferentes tipos de informações acerca
do município de Paulínia. Os arquivos digitais que compõem a base de dados
foram disponibilizados pela Prefeitura Municipal de Paulínia, pelo Instituto
Geográfico e Cartográfico do Estado de São Paulo (IGC), sendo também utilizados
os dados do censo de 2010 do IBGE, imagens de satélites e ortofotos. Através de
trabalhos de campo a autora realizou a observação dos diversos elementos da
cidade e efetuou visitas a imprensa local buscando compulsar a publicidade dos
imóveis anunciados nos anos de 2002 a 2012, o que lhe permitiu chegar à
variação anual dos preços médios por m² das propriedades ofertadas em cada
bairro de Paulínia no decênio pesquisado.
Ao
compreender as importantes faces da produção do espaço urbano e evidenciar os
diversos pontos no território de alocação desigual de infraestruturas e
investimentos, a pesquisadora constata que “o preço de um terreno ou imóvel
está atrelado não só às suas características intrínsecas, como tamanho, umidade
do solo, declividade e qualidade da construção, mas principalmente ao seu
acesso aos serviços, às infraestruturas e equipamentos urbanos, ou seja, à sua
localização”. Diante disso, ela se propôs verificar o real valor de mercado das
propriedades através da espacialização de seus preços e comparar com o valor
venal estabelecido na legislação.
Buscando
este entendimento, ela descobriu que os valores venais instituídos na Planta
Genérica de Valores de Paulínia, regulamentada em 1997 para lançamento do IPTU
do ano subsequente, não foram reavaliados a preços de mercado tendo sido
mantidos “congelados” desde então. Naquela época os valores venais mais altos
correspondiam aos imóveis do centro tradicional da cidade e iam diminuindo em
direção às periferias. Embora tenham ocorrido no município transformações em
relação ao uso e ocupação da terra, o poder público mostra-se alheio à
realidade do mercado e adota uma tributação extremamente desatualizada. A
pesquisadora atribui duas razões para a inércia da prefeitura em relação ao
IPTU: uma é o alto valor da receita municipal advinda do ICMS que permite abrir
mão de uma maior arrecadação e a outra é a de que nenhum político deseja ser
responsabilizado pela medida impopular de um possível aumento na taxação tributária.
Em
consequência desta realidade, o mapa de preços de mercado hoje não é compatível
com o mapa de valores venais. Com efeito, o preço do m² médio dos edificados
aumentou 233% no período considerado. A maior variação ocorreu no Parque Bom
Retiro (660%), um bairro popular até meados de 2000, ocasião em que recebeu um
loteamento fechado de alta valorização, que mudou totalmente a configuração do
local. As menores variações de preço verificaram-se na Vila Paulino Nogueira,
um bairro que continuou popular, e no centro da cidade, onde os preços já eram
tradicionalmente mais altos. Mudanças similares ocorreram em relação aos
terrenos, cujo preço médio por m² variou em torno de 300%.
Constatações
As
análises e mapas produzidos mostram o deslocamento dos maiores preços das
propriedades que antes se localizavam na área central tradicional e agora se
verificam nos bairros Jardim América e Morumbi que estão próximos ao Complexo
Cultural Parque Brasil 500. Este local, relativamente periférico da cidade,
abrange agora a Prefeitura Municipal de Paulínia, além de diversos equipamentos
– a exemplo da concha acústica, do sambódromo, do pavilhão de eventos, do
teatro, dos estúdios cinematográficos e do Complexo Rodoviária-Shopping – que
estão servindo como atrativos para a população de mais alta renda. Os atributos
dessa área vêm acarretando na sua conversão no que pode ser chamado de nova
centralidade, termo que se justifica pela boa acessibilidade viária, pela
qualidade do espaço e das atividades que o ocupam, o que tem impulsionado a
valorização e a especulação imobiliária na localidade. Aproveitando as
vantagens advindas dos investimentos públicos, os agentes do setor imobiliário
também têm investido no entorno do complexo cultural, sobretudo com a
implantação de empreendimentos fechados horizontais e verticais, onde o que se
adquire não é apenas o imóvel ou terreno, mas todo o conjunto de conceitos
propagados pela publicidade, como segurança, áreas verdes, tranquilidade,
acessibilidade, que também contribuem para inflacionar os preços.
Para
Fernanda “como as informações sobre as mudanças que vêm ocorrendo no uso e na
ocupação da terra urbana não estão sendo atualizadas pela prefeitura, isso tem
causado defasagem dos dados presentes na PGV e, consequentemente, nos lançamentos
do IPTU. Em consequência, a cobrança tributária acaba não sendo justa e, pior,
não há recuperação dos investimentos realizados pelo poder público. Esse
retorno poderia ser investido em melhorias de serviços e infraestruturas para
outras áreas da cidade ou mesmo ser revertido para programas habitacionais,
minimizando carências”.
E
acrescenta: “na cidade pode-se observar a materialização espacial das
desigualdades sociais, num contexto onde cada vez mais o valor de troca se
sobrepõe ao valor de uso, o que significa dizer que as regras e estratégias da
mercantilização do espaço urbano se impõem, muitas vezes, às próprias
necessidades humanas. Tal fato revela que o capital aparece no comando dos
interesses, definindo e direcionando as prioridades de determinados agentes
sociais”.
A
autora espera que o trabalho possa contribuir para políticas públicas de gestão
territoriais e incitar novos estudos que visem o entendimento da temática de
valorização da terra urbana.
Fonte:
Jornal da Unicamp nº 611.
Texto: CARMO GALLO NETTO
Fotos: Matias, L.F./Farias, F.O./Divulgação, Antoninho Perri
Edição de Imagens: Diana Melo
Texto: CARMO GALLO NETTO
Fotos: Matias, L.F./Farias, F.O./Divulgação, Antoninho Perri
Edição de Imagens: Diana Melo
Publicação
Dissertação:
“Análise da dinâmica de valorização diferencial da terra urbana na cidade de
Paulínia – SP”
Autora: Fernanda Otero de Farias
Orientador: Lindon Fonseca Matias
Unidade: Instituto de Geociências (IG)
Autora: Fernanda Otero de Farias
Orientador: Lindon Fonseca Matias
Unidade: Instituto de Geociências (IG)